Jornal do Brasil
Mario Marques
17/02/2009
RIO - Acostumei-me a xingamentos ou insatisfações de todos os níveis desde que decidi, coitado, virar jornalista/crítico de música, no fim dos anos 80. Sem internet, aguardávamos nas redações as cartas e os telefonemas refratários e furiosos às resenhas/reportagens. Poderíamos não lê-las ou simplesmente não atendê-los. Mas agora não dá mais. A grita começa no subject de sua caixa de entrada de e-mails, o espaço para o assunto. Você é invadido – e, democraticamente, como neste momento, publico o doloroso do leitor Gonçalo Plantier, a respeito de minha ojeriza a blocos, na semana passada. Pega aí:
“Certamente alguma vez já efetuaram pesquisas para avaliar o perfil dos vossos leitores, e acho que será baseado nessas pesquisas que direcionem as vossas pautas editoriais. Enquadrando o Caderno B nesse público, com certeza o sr. Mario Marques não se enquadra no mesmo, pela constante insistência em se lamuriar em sua coluna semanal, nos relatando seus complexos e frustrações, e falando mal de assuntos óbvios que são de agrado público, mas que insiste em expressar a sua antipatia pelos mesmos. Não só somos obrigados a ler a sua coluna – eu pessoalmente não leio mais, mas ontem não resisti e fui dar uma olhada para verificar se por acaso teria melhorado, mas infelizmente não. Mais uma vez expressa suas loucuras por rock e antipatia por carnaval. Não bastasse isso, e como responsável pelo Caderno B, ainda publica na edição de hoje cartas de leitores, se é que não são amigos, dando apoio à sua opinião. Por que não publica também as correspondências que foram contra sua opinião? Façam-nos um favor, por favor, deixem-no lá tomando conta do Caderno B, mas deem seu espaço semanal a alguém que escreva algo de agrado dos vossos leitores, mas definitivamente não a sua”.
Plantier é um leitor aplicado e eclético. No ano passado (5/8), defendera o CQC aqui também com dentes e unhas:
“Acho que como vosso leitor e assinante há vários anos, cabe-me o direito de manifestar o meu desagrado em ver em vosso jornal colunas do tipo da que o sr. Mario Marques escreveu no Caderno B da edição de hoje, dia 5 de agosto, com o título Abaixo o CQC.
Aparentemente o referido colunista tem algum problema pessoal com o sr. Marcelo Tas e sua equipe, como fica visível em sua crônica, e isto não lhe dá o direito, só porque tem um espaço num veículo de imprensa, de transmitir sua opinião pessoal sobre o programa, conforme o fez, pois, como é de conhecimento e unanimidade geral, o programa é líder de audiência e considerado pelo público de todas as classes que o assistem como o melhor programa da TV brasileira. Exatamente por seu humor inteligente e oportuno. Lamento profundamente que o sr. Mario Marques tenha utilizado a sua coluna para nos demonstrar sua pouca inteligência e competência para exercer a atividade de colunista de um veículo como o JB, pois este sr. fica muito aquém do nível de profissionais que nós leitores esperamos encontrar em suas páginas”.
Agradeci a Plantier o e-mail sobre os blocos, mas ele não me respondeu.
Confesso que o corredor cerebral por que passam essas linhas não é lá mesmo muito Carlinhos Brown. É mais Nei Lisboa, mais Ian Curtis. É como nevasca em dia de sol límpido. Talvez por conta disso tenha passado as duas últimas décadas a constar de uma seletíssima lista de odiados até por quem não tem a menor ideia de quem eu seja. Estamos, infelizmente, habitando um universo regido pelas verdades absolutas da internet, ecoadas nas mesas de bar e perigosamente rearranjadas nos becos escuros da mediocridade.
Exemplo clássico: a cena se passa na Pizzaria Guanabara, Leblon, Zona Sul do Rio, fim dos anos 90, lá pelas 3 da manhã. Acompanhado de dois amigos, conversávamos sobre a crítica de música no Brasil. Eu dizia que estávamos no começo do fim do ofício, em que jornalistas não tinham mais opiniões próprias, passando a reproduzir a média das opiniões dos sites especializados. Dessa maneira críticos faziam suas críticas, cronistas escreviam suas crônicas ou dissecavam livros grossíssimos sem virar nenhuma página. Pois no meio da pororoca semi-intelectual senta um conhecido de um dos amigos e lança-se a falar mal dos críticos. Até que, em dado segundo, o cidadão o qual jamais vira na vida atira essa:
– Esses críticos são uns vendidos! Trocam críticas por drogas! Você não vê esse Mario Marques! Outro dia eu vi o cara cheirando na pia do banheiro com um monte de músico! No dia seguinte ia escrever que o disco do cara era bom, claro!
Um adendo: eu nunca usei droga. Nenhuma. De nenhum tipo, nem para experimentar. Embora não tenha nada contra quem use. Minto: talvez um Tom Zé aqui ou um Belle & Sebastian acolá, bem arrependido. Meus amigos sabiam disso. Antes de o cara terminar a loucura, um deles pediu gentilmente que se retirasse da mesa. Temia por sua integridade física. Mas eu nem pensara nisso. Só ficara em estado de choque. De onde e como o sujeito me tira uma dessas da cabeça? E de onde surgiu essa loucura toda? Já tive e-mail adulterado, já inventaram de tudo, as mais desvairadas fofocas. O que me espanta mais é a perda de tempo das pessoas com a minha desimportância. E isso não é exclusividade minha, claro.
Num mundo em que as pessoas lutam, bravias, para sobreviver, individualistas, em que cada vez menos praticamos benesses, cada vez menos paramos para emprestar cortesia e palavras de esperança, parece-me que a pureza congelou. Por isso, Plantier, em sua homenagem, a partir de agora vou aposentar o mau humor.
terça-feira, 17 de fevereiro de 2009
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