sábado, 18 de abril de 2009

Artista argentino constrói relógio gigante em SP

SILAS MARTÍ
da Folha de S.Paulo
18/04/2009

Nenhum minuto é igual a outro na obra de Jorge Macchi. Ele já inventou um relógio digital em que os números eram palitos de fósforo, que mudavam com o passar das horas, sem nunca pegar fogo. Também já desenhou um relógio em que o ponteiro dos segundos era uma gota de sangue.
Mantendo a cor vermelha do desenho, o artista argentino montou agora seu maior relógio: um grande círculo que ocupa a sala octogonal da Pinacoteca do Estado. O ponteiro gigante dá uma volta completa em 60 segundos, varrendo o chão com um sensor para tocar uma espécie de sinfonia do tempo.
Sergio Zacchi/Folha Imagem
Jorge Macchi e Edgardo Rudnitzky e o relógio gigante na Pinacoteca

São as imperfeições do piso traduzidas pelo músico Edgardo Rudnitzky, parceiro de Macchi, numa trilha incidental para cada minuto que passa. "Música e tempo são bons amigos", diz Rudnitzky, 52. "Esse é um tempo interno, de expectativas, que se alarga com mudanças mínimas minuto a minuto."
Mas quase nada acontece. Macchi enxerga o tempo como intervalo entre dois acontecimentos que ele nunca revela. Suas obras mostram o interstício, o espaço morto grávido de passado e futuro entre instantes de uma narrativa secreta.
Se no relógio de fósforos e na gota de sangue que marcava os segundos ele confessa que "existia a possibilidade de uma catástrofe que nunca vinha", aqui o tom é outro. "Importa a contemplação, a imagem da continuidade", diz Macchi, 45.
É um quadro que ganha mais força ainda sob o teto de vidro da Pinacoteca. O passeio do sol pelo céu desloca as sombras desse relógio no chão, numa terceira dimensão embalada pela música do próprio espaço, já que o piso funciona como partitura da composição.
"A sala se transforma num relógio duplo, solar e de segundos", descreve Macchi. "Queríamos um vínculo com a arquitetura, o aspecto mais poderoso desse lugar", diz Rudnitzky.
Poderoso porque vazio. Macchi já martelou pregos numa parede formando a partitura de uma sinfonia, também já instalou um globo de espelhos no teto de uma sala esburacada como alusão à algazarra morta do fim de festa. Agora são só as paredes despidas em torno de outro tipo de tempo e música que fogem ao tiquetaque maçante.
No lugar da catástrofe consumada ou vindoura, a paz dos minutos quase iguais. "É um eterno retorno, mas com leves mudanças, mais espaço para o som", diz Macchi. "Um psicólogo diria que estou curado."
JORGE MACCHI
Quando: abertura hoje, às 11h; de ter. a dom., das 10h às 18h; até 31/5
Onde: Pinacoteca do Estado (pça. da Luz, 2, tel. 3324-1000)
Quanto: R$ 4; grátis sáb.

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